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Antonia Urrejola é relatora para o Brasil na CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) da OEA (Organização dos Estados Americanos) (Divulgação)

“Um país que tem chamado a atenção da CIDH de maneira prioritária em matéria de segurança cidadã é o Brasil”. É assim que Antonia Urrejola, relatora para o Brasil da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), define a situação de segurança pública vivida pelo país.

Os dados apresentados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, por meio do Atlas da Violência de 2018, que apontam para 62.517 assassinatos no país em 2016, preocupam o órgão internacional de direitos humanos.

Outro fator que chama atenção é a seletividade racial. De acordo com os números do estudo, a taxa de mortalidade de negros foi 2,5 vezes maior do que a de não negros.

O crescimento da violência e do discurso de militarização no país também preocupam a CIDH.

De acordo com Antonia Urrejola, a crise na segurança pública no país também tem aumentado os índices de letalidade e uso excessivo de força por parte da polícia.

Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, com base nos registros policiais, estimam que cerca de 4.222 pessoas foram vítimas de agentes de segurança em 2016.

Os números apontam que 76,2% dessas vítimas eram negras.

Diante desses dados, Antonia Urrejola indica a necessidade de construção de políticas de diminuição da letalidade policial contra pretos e pardos, grupos de cor que formam o segmento racial negro.

“No caso concreto do Brasil, o Estado deve adotar políticas de segurança cidadã integradas, que incorporem medidas de combate ao racismo institucional na ação dos agentes policiais, como o uso de perfis raciais e a perseguição policial ostensiva a pessoas afrodescendentes”.

O órgão destaca que uma política de segurança pública completa exige uma perspectiva mais ampla do que o combate à criminalidade e um discurso de aumento da punição.

Antonia Urrejola acredita ser necessário prevenir e controlar os mecanismos que geram violência e insegurança.

“O conceito de segurança deve colocar maior ênfase no desenvolvimento de trabalhos de prevenção e no controle dos fatores que geram violência e insegurança”.

Confira a entrevista:

De acordo com o Atlas da Violência, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública sobre os índices de homicídio em 2017, 62.517 pessoas foram assassinadas. Como a CIDH avalia a situação da segurança pública no Brasil?

Um país que tem chamado a atenção da CIDH de maneira prioritária em matéria de segurança cidadã é o Brasil. No seu relatório anual de 2018, a CIDH manifesta a sua preocupação com a situação de violência no país tanto no âmbito urbano quanto no rural.

Em particular, a Comissão destaca que a crise de segurança cidadã no contexto urbano tem intensificado os casos de uso excessivo da força por parte da polícia e aumentado os índices de letalidade.

Ademais, no caso concreto do Brasil, o Estado deve adotar políticas de segurança cidadã integradas, que incorporem medidas de combate ao racismo institucional na ação dos agentes policiais, como o uso de perfis raciais e a perseguição policial ostensiva a pessoas afrodescendentes.

Para a CIDH, qual seria a melhor política de segurança pública a ser adotada por um Estado comprometida com os direitos humanos?

A segurança tem sido desde sempre uma das principais funções dos Estados. Sem dúvida, com a evolução dos Estados autoritários para os Estados democráticos, também foi evoluindo o conceito de segurança.

Como efeito, o conceito de segurança que se utilizava antes se preocupava unicamente por garantir a ordem como uma expressão de força e supremacia do poder do Estado. Hoje em dia, os Estado democráticos promovem modelos policiais de acordo com a participação dos habitantes.

Assim, na perspectiva dos direitos humanos, quando falamos sobre segurança, não podemos nos limitar à luta contra a criminalidade. Estamos falando de como criar um ambiente propício e adequado para a convivência pacífica das pessoas.

Por essa perspectiva, o conceito de segurança deve colocar maior ênfase no desenvolvimento dos trabalhos de prevenção e no controle dos fatores que geram violência e insegurança, do que em tarefas meramente repressivas ou reativas ante aos fatos consumados.

Quando se fala sobre segurança cidadã e direitos humanos, os cidadãos pensam que estamos falando exclusivamente sobre os direitos humanos dos criminosos. Mas o conceito é muito mais amplo.

A insegurança gerada pela criminalidade e a violência nas Américas constitui um grave problema onde está em jogo a vigência dos direitos humanos dos cidadãos em geral e muito especialmente das vítimas afetadas por essa criminalidade e violência.

Das 62.517 vítimas de assassinato no Brasil em 2017, 71,5% eram negras. Como a CIDH avalia a situação da população negra no país?

No seu relatório anual de 2018, ao se referir ao Brasil, a CIDH manifesta preocupação por esses números que você aponta e destaca a necessidade de uma política de segurança cidadã focada no combate ao racismo institucional, assim como a necessidade do Estado brasileiro adotar políticas públicas que contemplem de forma prioritária o funcionamento de uma estrutura institucional eficiente que garanta a população afrodescendente o aproveitamento efetivo dos seus direitos econômicos, sociais e culturais.

Essas políticas devem estar dirigidas a reduzir os efeitos da pobreza e as disparidades sociais históricas, que geram uma situação de vulnerabilidade e discriminação acentuada. (YahooNotícias)